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Investigación bibliotecológica

versão On-line ISSN 2448-8321versão impressa ISSN 0187-358X

Investig. bibl vol.35 no.86 Ciudad de México Jan./Mar. 2021  Epub 01-Ago-2021

https://doi.org/10.22201/iibi.24488321xe.2021.86.58266 

Artículos

Bibliotecas acadêmicas e gestão de dados de pesquisa: uma revisão bibliográfica

Bibliotecas académicas y gestión de datos de investigación: una revisión bibliográfica

Academic libraries and research data management: a bibliographic review

Érika Rayanne Silva de Carvalho* 

Fernando César Lima Leite** 

Patrícia Rocha Bello Bertin*** 

* Procuradoria Regional da República da 1ª Região, Ministério Público Federal, Brasil erikaunb@gmail.com

** Universidade de Brasília, Faculdade de Ciência da Informação, Brasil fernandoc@unb.br

*** Secretaria de Desenvolvimento Institucional, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, Brasil patricia.bertin@embrapa.br


Resumo

Este artigo teve por objetivo analisar os desafios enfrentados por bibliotecas acadêmicas na gestão de dados de pesquisa, conforme apresentado na literatura científica. Para tanto, foi feita uma investigação bibliográfica a partir da base de dados Library and Information Science Abstracts (LISA). Após avaliação criteriosa, dezesseis artigos foram selecionados, os quais foram base para a elaboração de um modelo descritivo da gestão de dados de pesquisa em bibliotecas acadêmicas. Os resultados da pesquisa mostraram que a elaboração da política e do plano de gestão de dados, o desenvolvimento de infraestrutura tecnológica, o processamento e a análise de dados, o compartilhamento e a preservação de dados, a capacitação de pesquisadores e de bibliotecários são as principais ações desenvolvidas pelas bibliotecas. Porém, essas enfrentam desafios como lidar com as diferenças disciplinares, a falta de recursos financeiros, a sensibilização de pesquisadores para a elaboração do plano de gestão de dados, a criação de repositórios de dados, a definição de padrões para o compartilhamento e arquivamento de dados, e a falta de capacitação de bibliotecários em serviços de gestão de dados de pesquisa. Para superá-los, conclui-se que a atualização profissional do bibliotecário é fundamental.

Palavras-chave: Comunicação Científica; Dados Científicos; Bibliotecas Universitárias

Resumen

Este artículo tuvo como objetivo analizar los desafíos que enfrentan las bibliotecas académicas en la gestión de datos de investigación, tal como se presenta en la literatura científica. Con este fin, se realizó una investigación bibliográfica en la base de datos Library and Information Science Abstracts (LISA). Después de una evaluación cuidadosa, se seleccionaron 16 artículos, que fueron la base para el desarrollo de un modelo descriptivo de la gestión de datos de investigación en bibliotecas académicas.

Los resultados de la investigación mostraron que la elaboración de la política y el plan de gestión de datos, el desarrollo de infraestructura tecnológica, el procesamiento y análisis de datos, el intercambio y la preservación de datos, la capacitación de investigadores y los bibliotecarios son las principales acciones desarrolladas por las bibliotecas. Sin embargo, se enfrentan desafíos como lidiar con las diferencias disciplinarias, la falta de recursos financieros, la sensibilización de investigadores para la elaboración del plan de gestión de datos, la creación de repositorios de datos, la definición de estándares para compartir y archivar datos, y la falta de capacitación de bibliotecarios en servicios de gestión de datos de investigación. Para superarlos, se concluye que la actualización profesional del bibliotecario es esencial.

Palabras clave: Comunicación Científica; Datos Científicos; Bibliotecas Universitarias

Abstract

This article aimed to analyze the challenges faced by academic libraries in the research data management, as it is presented in the scientific literature. To this end, a bibliographic investigation was carried out using the Library and Information Science Abstracts (LISA) database. After careful evaluation, sixteen articles were selected, which constituted the basis for the elaboration of a descriptive model for research data management in academic libraries.

The results of this showed that the elaboration of the policy and of the research data management plan, the development of technological infrastructure, the processing and analysis of data, the sharing and preservation of data, and the training of researchers and librarians, are the main actions developed by libraries. However, the libraries face challenges such as dealing with disciplinary differences, the lack of financial resources, the awareness of researchers for developing the research data management plan, the creation of data repositories, the definition of standards for data sharing and archiving, and the lack of training for librarians in research data management services. To overcome all of this, it is concluded that the professional updating of the librarian, is essential.

Keywords: Scientific Communication; Scientific Data; University Libraries

Introdução

A o caracterizar a denominada sociedade da informação e do conhecimento, Orera-Orera (2007) destacou o valor econômico atribuído à informação, o uso intensivo de tecnologias da informação e comunicação - sobretudo por meio da Internet, e influências sociais decorrentes da globalização. À luz desse contexto, a autora afirma que as bibliotecas tiveram que adaptar vários serviços tradicionalmente oferecidos, passando a assumir novas práticas e, por conseguinte, assimilando outras responsabilidades.

Da mesma forma, nota-se que as bibliotecas acadêmicas vivenciam os reflexos dessa nova conjectura arquitetada pela sociedade da informação e do conhecimento. De acordo com Faqueti, Alves e Steil (2016) tais bibliotecas precisam inovar os serviços e produtos oferecidos, adequando-os às novas tecnologias, às diferentes demandas ou expectativas de usuários e aos desafios inerentes ao contexto educativo. Conforme ressaltado por Bosc e Harnad (2005), observa-se a necessidade de bibliotecários estarem conscientes sobre como devem atuar profissionalmente na era da Internet, na qual novas ferramentas são adotadas para armazenar e recuperar informações disponíveis em meio impresso ou digital.

As bibliotecas acadêmicas, também denominadas bibliotecas universitárias, podem ser entendidas como unidades organizacionais vinculadas a instituições de ensino superior, tais como universidades, faculdades e institutos técnico-científicos. São bibliotecas que atendem às necessidades e às demandas de informação da comunidade interna - predominantemente constituída por docentes, discentes e servidores técnicos-administrativos - muitas vezes estendendo-as também à comunidade local (Faqueti, Alves e Steil, 2016).

De acordo com Orera-Orera (2007), as bibliotecas acadêmicas são centros de recursos informacionais cuja missão principal é proporcionar à comunidade universitária acesso a registros do conhecimento, de modo a auxiliar as atividades de docentes, pesquisadores e estudantes. Para a autora, essas bibliotecas devem assimilar em seu modelo de gestão: a filosofia da globalização; o uso de novas tecnologias de informação e comunicação; a realização de atividades cooperativas e pautadas por critérios de qualidade.

À vista disso, é crescente a preocupação de bibliotecas acadêmicas quanto à atuação profissional de bibliotecários sobre os dados de pesquisa, que, por seu turno, podem ser considerados ativos imprescindíveis na geração do conhecimento científico e na condução de novos ciclos de pesquisa. De acordo com Surkis e Read (2015), bibliotecários têm se mobilizado em oferecer diversos serviços voltados à gestão de dados de pesquisa, que incluem a elaboração de guias e manuais sobre o tema, a realização de novas práticas de gestão de dados e a prestação de consultorias a agências de fomento à pesquisa e editores de publicações científicas.

Sayão e Sales (2015) argumentam em favor de uma gestão de dados de pesquisa colaborativa, cujas responsabilidades não recaiam apenas sobre pesquisadores. Isso porque essa é uma questão que remete às perspectivas de diferentes atores inerentes ao processo de comunicação científica que primam pela qualidade, integridade e preservação desses dados. Nesse contexto, as bibliotecas - que já exerciam um papel fundamental como unidade organizacional de referência no processamento técnico e disponibilização de conteúdos produzidos nas universidades - neste momento devem ampliar seu rol de atividades, de modo a incluir aquelas referentes à gestão de dados de pesquisa.

Ainda assim, Awre et al. (2015) alertam que serviços de dados de pesquisa precisam superar muitos desafios, os quais podem ser destacados: a ausência de um consenso quanto à linguagem e aos conceitos adotados em relação aos dados de pesquisa - devido as diferentes disciplinas em que atuam os pesquisadores; a complexidade intrínseca ao processo de pesquisa; a falta de recursos financeiros aplicados à gestão de dados de pesquisa; a necessidade de compreender as relações de poder e identidade que circundam as universidades.

Ao se referir às diferenças disciplinares em relação aos dados de pesquisa, destaca-se o estudo de Carvalho e Leite (2019) realizado no Brasil, com pesquisadores em química, antropologia e educação. O estudo identificou diferenças entre as disciplinas, relacionadas às práticas de: 1) produção/obtenção de dados de pesquisa - modos de produção/obtenção dos dados e suas características; 2) compartilhamento de dados de pesquisa - utilidade dos dados para outros pesquisadores, disposição de pesquisadores para o compartilhamento de dados, reação de pesquisadores quanto à obrigatoriedade do compartilhamento de dados por entidades científicas, destinação dos dados após a pesquisa; 3) reuso de dados de pesquisa - percepção de pesquisadores sobre o reuso de dados de pesquisa, disposição para o reuso de dados.

Nessa direção, reiteram-se as diferenças disciplinares relacionadas aos dados de pesquisa apontadas por Marcum e George (2010), uma vez que os autores ressaltaram que os dados são derivados de várias fontes e abordam assuntos diversos. De maneira semelhante, Sayão e Sales (2015) afirmaram que é preciso desenvolver estratégias para a gestão de dados de pesquisa que considerem a pluralidade desses, principalmente no que tange à variabilidade de formatos e análises sobre os mesmos.

Considerando o cenário delineado, pode-se observar o quão relevante é a realização de estudos que se dediquem sobre a gestão de dados de pesquisa em bibliotecas acadêmicas e os desafios enfrentados nesse contexto. Em razão disso, o presente estudo teve o objetivo de analisar os desafios enfrentados por bibliotecas acadêmicas na gestão de dados de pesquisa, conforme apresentado na literatura científica. Para fins de síntese e estruturação temática, este artigo foi organizado em seções que referem-se: à introdução ao estudo, ao relato dos procedimentos metodológicos adotados na pesquisa; aos estudos oriundos da literatura científica; à discussão sobre esses estudos e às considerações finais do trabalho.

Procedimentos metodológicos

Em razão do objetivo proposto inicialmente: analisar os desafios enfrentados por bibliotecas acadêmicas na gestão de dados de pesquisa, conforme apresentado na literatura científica; o presente estudo enquadra-se na concepção filosófica pragmática. Com base em Cherryholmes (1992), Morgan (2007) e em seus próprios escritos, Creswell (2010) destacou que o pragmatismo caracteriza-se, sobretudo, por não haver comprometimento com um determinado sistema filosófico e de realidade, além da discricionariedade do pesquisador em adotar procedimentos metodológicos que melhor atendam à resolução de problemas e ao alcance dos objetivos de pesquisa.

O estudo apresenta natureza descritiva, principalmente em razão de três aspectos: 1) a preocupação central foi a descrição de fenômenos pesquisados; 2) o estágio de desenvolvimento do conhecimento já é precedente, haja vista que há referencial teórico e estudos anteriores relacionadas à gestão de dados de pesquisa e os desafios enfrentados por bibliotecas acadêmicas; 3) não houve o propósito de estabelecer relações de causa e efeito, ou teste de hipóteses, como ocorre em pesquisas correlacionais.

Trata-se de investigação bibliográfica na qual foi utilizada a base de dados Library and Information Science Abstracts (LISA) para a coleta de dados, escolhida por ser uma fonte de informação especializada em assuntos de interesse à Biblioteconomia e à Ciência da Informação. Além disso, a base de dados LISA é quantitativamente representativa em número de registros e qualitativamente significativa em relação à produção científica indexada. Os procedimentos adotados neste estudo em relação à coleta e análise dos dados são descritos conforme as seguintes etapas:

  1. Busca na base de dados. A coleta de dados na base LISA ocorreu no mês de junho de 2020, mediante o preenchimento de campos do formulário de busca avançada. O campo ‘Título do Documento (TI)’ foi preenchido com os termos ‘Research Data Management’, e ‘Librar*’, por meio do operador booleano ‘and’. O uso do caractere ‘*’ em ‘Librar’ justificou-se devido às alterações de singular e plural inerentes ao termo em inglês. O campo ‘Revisado por especialistas’ foi selecionado e o campo ‘data de publicação’ foi preenchido com a opção ‘todas as datas’, na medida em que não houve restrição temporal para a pesquisa. O tipo de fonte delimitou-se a ‘periódicos acadêmicos’, assim como o tipo de documento restringiu-se a ‘artigo’. O campo ‘Idioma’ foi delimitado a ‘inglês’ e documentos duplicados foram desconsiderados nos resultados da busca, pela marcação da opção ‘exclude duplicate documents’ no campo ‘Opções da página de resultados’.

  2. Recuperação de artigos. O resultado da busca feita na base de dados LISA recuperou 18 artigos, os quais foram avaliados, criteriosamente, para fins de seleção dos trabalhos que integrariam esta investigação bibliográfica.

  3. Seleção de artigos. Os títulos, resumos e palavras-chave de cada artigo recuperado foram minuciosamente analisados para a seleção de estudos que se referiam especificamente à gestão de dados de pesquisa no contexto das bibliotecas acadêmicas, ou seja, bibliotecas vinculadas a instituições universitárias. Em atenção a este critério, dois artigos foram excluídos do estudo por se referirem à gestão de dados de pesquisa sob perspectiva generalista, condizente a diferentes cenários, não estando diretamente relacionados ao contexto de bibliotecas acadêmicas. À vista disso, a revisão de literatura deste trabalho foi composta por 16 artigos, publicados entre 2008 e 2019.

  4. Análise dos artigos selecionados. O conteúdo dos 16 artigos selecionados para o estudo foi analisado com o propósito de identificar desafios enfrentados por bibliotecas acadêmicas na gestão de dados de pesquisa. Esta análise possibilitou o agrupamento em quatro tópicos ou categorias gerais que sintetizavam o teor dos desafios identificados nos artigos selecionados, sendo: 1) política e plano de gestão de dados de pesquisa; 2) infraestrutura tecnológica; 3) capacitação de pesquisadores; 4) capacitação de bibliotecários. Ademais, a análise realizada possibilitou a elaboração de um modelo descritivo que associa a gestão de dados de pesquisa em bibliotecas acadêmicas aos desafios enfrentados por essas.

A gestão de dados de pesquisa em bibliotecas acadêmicas e seus desafios

Os estudos analisados neste trabalho serão apresentados conforme agrupamento temático que sintetiza os principais desafios enfrentados pelas bibliotecas acadêmicas, na seguinte ordem: política e plano de gestão de dados de pesquisa; infraestrutura tecnológica; capacitação de pesquisadores; capacitação de bibliotecários.

Política e plano de gestão de dados de pesquisa

Piracha e Ameen (2019) relataram estudo que avaliou a estrutura e o planejamento de políticas relacionadas à gestão de dados de pesquisa em 30 bibliotecas universitárias paquistanesas. Por meio de dados coletados em questionários e entrevistas, verificou-se que a maioria das bibliotecas não possuíam uma política formal de gestão de dados de pesquisa e que este tópico de discussão ainda é muito recente para tais instituições. Nessa direção, alguns desafios foram destacados, como a falta de habilidades técnicas e gerenciais para a manipulação de dados e a infraestrutura tecnológica precária em muitas universidades.

Interessados em entender como bibliotecas acadêmicas desempenhavam serviços de gestão de dados de pesquisa e o que planejavam para o futuro a esse respeito, Cox et al. (2017) conduziram um estudo internacional no qual participaram de um levantamento 170 diretores de bibliotecas localizadas na Austrália, no Canadá, na Alemanha, na Irlanda, nos Países Baixos, na Nova Zelândia e no Reino Unido. O instrumento de coleta de dados foi um questionário online composto por 27 questões que abordaram tópicos relativos à política de gestão de dados de pesquisa, ao financiamento para o desenvolvimento de serviços de dados de pesquisa e a aspectos gerenciais. Ressalta-se, ainda, que a identificação de desafios vivenciados pelas bibliotecas nesse contexto também foi objeto de estudo da pesquisa.

Cox et al. (2017) observaram que à época em que os dados foram coletados (2014) a maioria das instituições investigadas (n = 167) já possuíam ou tinham expectativa de elaborar uma política de gestão de dados de pesquisa em 12 meses (Austrália 94 %, Canadá 40 %, Alemanha 100 %, Irlanda 71 %, Países Baixos 100 %, Nova Zelândia 71 %, Reino Unido 86 %). Ademais, o estudo demonstrou a imaturidade da maioria dos serviços de gestão de dados de pesquisa oferecidos pelas bibliotecas acadêmicas inquiridas. Em razão disso, estimou-se que a maturidade desses serviços deve ser alcançada somente em momento futuro, a partir da superação de alguns desafios.

Dentre os desafios apontados por Cox et al. (2017), podem ser destacados a falta de recursos financeiros para desempenhar atividades relativas à gestão de dados, as dificuldades em convencer pesquisadores sobre a importância da gestão de dados, a necessidade de coordenação/estruturação de atividades que requerem colaborações interdisciplinares da biblioteca com outros departamentos, escritórios de pesquisa e com os serviços de tecnologia da informação das universidades, a falta de treinamentos de bibliotecários no oferecimento de serviços de dados de pesquisa, e as dificuldades inerentes às diferenças disciplinares com relação aos dados de pesquisa.

Segundo Henderson e Knott (2015), a gestão de dados de pesquisa é fundamental no contexto das bibliotecas acadêmicas. Dessa forma, os autores relataram quais procedimentos relacionados à gestão de dados têm sido adotados em cada biblioteca dos dois campus da Virginia Commonwealth University (VCU): Tompkins-McCaw Library (TML) - com o foco em Ciências da Saúde - e James Branch Cabell Library - com cobertura de diversas áreas do conhecimento, como artes, humanidades e ciências sociais.

Fato relevante para as bibliotecas da VCU foi a nomeação, em 2013, de um diretor de gestão de dados de pesquisa, cargo criado para ser exercido por um bibliotecário da instituição. De mesmo modo, destaca-se que foi elaborado um plano de gestão de dados que integra a perspectiva de diferentes stakeholders, como pesquisadores, gestores, estudantes, instituições de fomento à pesquisa, entre outros. Ademais, esse plano abrangeu diversos aspectos, como a elaboração de guias sobre o desenvolvimento de repositórios e sua adequação temática, a criação de uma política que requisite o depósito de dados por parte de pesquisadores, o desenvolvimento de ferramentas tecnológicas para o suporte à gestão de dados, e o estabelecimento de parcerias estratégicas e de ações educativas com pesquisadores (Henderson e Knott, 2015).

A partir do relato de Henderson e Knott (2015), pode-se apontar alguns desafios relacionados a serviços de gestão de dados de pesquisa na VCU, dentre os quais destacam-se o uso de ferramentas tecnológicas para compartilhamento seguro de dados, a utilização de metadados e do Digital Object Identifier (DOI) em repositórios de dados. À vista disso, os autores ressaltaram o papel fundamental das bibliotecas na gestão de dados de pesquisa, na medida em que essas instituições são tradicionalmente reconhecidas por seu trabalho de organização de registros do conhecimento, localização de informações, categorização e descrição de diferentes tipos de materiais. Logo, a prestação de serviços de gestão de dados de pesquisa tornaram-se uma extensão natural de serviços prestados por bibliotecas ao longo do tempo.

Já no Canadá, Steeleworthy (2014) destacou que a gestão de dados de pesquisa tornou-se uma prática exigida às bibliotecas acadêmicas, principalmente devido a exigências presentes em políticas estabelecidas por agências nacionais de financiamento à pesquisa. Por conseguinte, foi necessário que tais bibliotecas ampliassem o rol de serviços que já desempenhavam, incorporando atividades relacionadas à coleta, à catalogação, ao acesso, ao arquivamento, à preservação e à referência de dados de pesquisa.

Infere-se, ainda, que a colaboração e o engajamento de stakeholders constituiu-se um desafio para uma gestão de dados de pesquisa efetiva, na medida em que ambos são considerados elementos vitais nesse processo. Por esta razão, Steeleworthy (2014) ressaltou a importância das bibliotecas acadêmicas estabelecerem parcerias com pesquisadores, conselhos de ética de pesquisa, grupos de pesquisa e outras bibliotecas. Nesse sentido, é fundamental uma postura multifacetada do bibliotecário na qual reiteram-se ações e serviços colaborativos entre bibliotecários de diversos campus das universidades (Steeleworthy, 2014).

Infraestrutura tecnológica

Em um ensaio, S. Yu (2017) relatou conversas com três bibliotecários e um técnico de dados atuantes em três universidades canadenses, com o propósito de obter uma perspectiva profissional em relação à gestão de dados de pesquisa. Nessa direção, verificou-se que bibliotecários que lidam com dados de pesquisa têm trabalhado com a implementação de repositórios de dados, sendo relevante para esse fim, ter à disposição infraestrutura técnica e suporte de tecnologia da informação. Todavia, entre os desafios observados em relação ao desenvolvimento de serviços de gestão de dados de pesquisa, destacou-se a insuficiência de suporte em termos de disponibilidade de espaço no servidor e de outros recursos tecnológicos.

Cox, Pinfield e Smith (2016) analisaram a perspectiva de bibliotecários sobre a gestão de dados de pesquisa, à luz do conceito de ‘problema perverso’ apresentado por diversos autores (Ritell e Webber, 1973; Conklin e Weil, 1997; Verweij e Thompson, 2006; Horn e Weber, 2007; Mcleod e Childs, 2013, citados por Cox, Pinfield e Smith, 2016). Um problema perverso caracteriza-se, sobretudo, pela falta de controle do pesquisador sobre o processo natural de fenômenos e suas variáveis. Além disso, é um problema único que possibilita a proposição de diferentes maneiras para solucioná-lo. Em contrapartida, isso dificulta a aprendizagem sobre como resolver problemas anteriores, uma vez que determinada solução aplica-se somente a um contexto problemático específico (Ritell e Webber, 1973, citado por Cox, Pinfield e Smith, 2016).

Sendo assim, Cox, Pinfield e Smith (2016) realizaram por telefone entrevistas semiestruturadas com 26 bibliotecários atuantes em bibliotecas acadêmicas do Reino Unido, a fim de descrever aspectos de serviços de gestão de dados de pesquisa desempenhados por essas instituições. Os resultados do estudo apontaram que uma agenda de gestão de dados de pesquisa é constituída por stakeholders de diferentes áreas profissionais relacionadas a serviços de tecnologia da informação, a serviços de suporte a pesquisa, à consultoria de procedimentos legais, a lideranças de grupos de pesquisa, entre outros. Todavia, alguns problemas podem ser destacados nesse âmbito, como o difícil consenso entre stakeholders sobre as melhores práticas a serem seguidas referentes à gestão de dados pesquisa.

Outrossim, apesar de necessária, a criação de repositórios de dados de pesquisa ainda esbarra em desafios relacionados principalmente à definição de qual tipo de dado deve ser hospedado, quais metadados devem ser utilizados na descrição de conjuntos de dados e quais assuntos tais repositórios devem cobrir. Ademais, os bibliotecários entrevistados relataram que pouco sabem a respeito do comportamento informacional de pesquisadores, sendo fundamental para a gestão de dados de pesquisa desenvolver a empatia sobre a perspectiva informacional dos próprios pesquisadores (Cox, Pinfield e Smith, 2016).

Sob o espectro de serviços de gestão de dados prestados por bibliotecas acadêmicas na África do Sul, Chiware e Mathe (2015) conduziram um estudo que objetivou relatar como a biblioteca da Cape Peninsula University of Technology (CPUT) vem integrando esses serviços a sua rotina de trabalho e quais os desafios institucionais até agora enfrentados.

A biblioteca do CPUT é uma divisão institucional que tem unido esforços para o desenvolvimento de sistemas, plataformas e processos para a gestão de dados de pesquisa. Assim, um grupo de trabalho foi criado para análise e desenvolvimento de políticas de gestão de dados que definam, com clareza, as funções e responsabilidades de stakeholders. Ademais, uma infraestrutura de softwares de fonte aberta tem sido desenvolvida para viabilizar o ciclo de vida dos dados, de modo a armazená-los, tratá-los e disponibilizá-los sem restrições de acesso (Chiware e Mathe, 2015).

Nesse caso, o maior desafio encontrado foi a falta de capacitação ou treinamentos direcionados aos bibliotecários que lidam com dados de pesquisa, na medida em que tornou-se necessário uma compreensão mais profunda desses profissionais com relação a particularidades de diferentes tipos de dados e às práticas informacionais de pesquisadores. Em razão disso, a biblioteca da CPUT criou um programa de capacitação para bibliotecários que atuam em serviços de gestão de dados de pesquisa. Para este fim, o programa incluiu temáticas relacionadas ao trabalho em rede, aos direitos de propriedade intelectual, às metodologias de pesquisa, aos estudos altimétricos, entre outros assuntos (Chiware e Mathe, 2015).

Peters e Dryden (2011) relataram estudo conduzido por bibliotecários do Department of Liaison Services sobre as necessidades de gestão de dados dos principais pesquisadores que trabalham em projetos na National Science Foundation (NSF) e no National Institutes of Health (NIH). A pesquisa incluiu entrevistas com estudantes de graduação, pós-doutorado e técnicos de laboratório. Entre os resultados obtidos, destacam-se dificuldades dos pesquisadores relacionadas ao cumprimento de requisitos de gestão de dados estabelecidos por agências financiadoras, à obtenção de suporte para visualização de dados e de sistema apropriado para o compartilhamento de dados.

Capacitação de pesquisadores

Tripathi, Shukla e Sonkar (2017) conduziram estudo sobre práticas de gestão de dados de pesquisa adotadas por 47 universidades indianas, dentre as quais 20 integraram o ranking do Times Higher Education (ano 2016-2017). Para tanto, os autores investigaram os websites de todas as 47 universidades e os de suas bibliotecas com o propósito de compreender como serviços de gestão de dados de pesquisa estão sendo implantados, tendo em vista a coleta, organização e curadoria dos dados.

Os resultados da pesquisa apontaram que as bibliotecas das 20 melhores universidades indianas apontadas no Times Higher Education disponibilizaram conteúdos, em profundidade, a respeito de assuntos como: elaboração do plano de gestão de dados de pesquisa, a partir de consultorias prestadas a pesquisadores conforme o ciclo de vida dos dados; depósito de dados em repositórios de dados científicos, em atendimento a requisitos de metadados e a formatos de arquivos preferencialmente não proprietários; cópia de segurança de dados; referência e citação de dados; políticas de gestão de dados; e educação do usuário (realização de workshops, interação face a face, desenvolvimento de programas de treinamento) (Tripathi, Shukla e Sonkar, 2017).

A pesquisa realizada por Tripathi, Shukla e Sonkar (2017) também contribuiu para apontar alguns desafios enfrentados por bibliotecários que atuam em universidades indianas, relacionados aos serviços de gestão de dados de pesquisa que esses desempenham, a saber: a necessidade de capacitação para realizarem atividades centradas na gestão de dados; a demanda por treinamento de pesquisadores no uso de metadados para a descrição de dados e no depósito de dados em repositórios de dados científicos; a dificuldade de conscientizar e sensibilizar pesquisadores sobre a importância da elaboração do plano de gestão de dados, antes do início do projeto de pesquisa; e a realização de estudos que investiguem como pesquisadores geram e mantêm dados de pesquisa e quais serviços esperam obter da biblioteca.

Delserone (2008), por sua vez, destacou a contribuição estratégica da biblioteca na gestão de dados de pesquisa na University of Minnesota (UMN), quando relatou a respeito do serviço denominado E-Science and Data Services Collaborative (EDSC), no qual um bibliotecário de serviços de dados trabalha colaborativamente em prol da gestão, preservação, acesso e uso de dados de pesquisa. Futuramente, esse profissional também desenvolverá programas relacionados à capacitação de usuários em relação ao reuso de dados.

Além disso, Delserone (2008) ressaltou a criação da Research Cyberinfrastructure Alliance (RCA), em 2007, que idealmente estabeleceu as funções da biblioteca da UMN na RCA, sendo essas: a consultoria em arquivamento de dados; a prática de atividades educacionais; a construção de portais na Internet para pesquisadores; a elaboração de políticas de gestão de dados e a certificação de repositório de dados. Infere-se, ainda, que a implementação do EDSC e da RCA é desafiadora para a instituição, porém, ilustra um caminho potencial para o desenvolvimento de serviços de gestão de dados de pesquisa em bibliotecas acadêmicas.

Capacitação de bibliotecários

Read et al. (2019) relataram programa piloto que forneceu treinamento em serviços de gestão de dados de pesquisa a 26 bibliotecários em seis universidades, a saber: Universidade em Buffalo; Universidade de Delaware; Universidade Drexel; Universidade Duquesne; Universidade Stony Brook; Universidade Temple. Por meio de entrevistas concedidas por cada uma dessas instituições, constatou-se a existência de desafios relacionados à gestão de dados de pesquisa, tais como a melhoria da visibilidade da biblioteca no domínio de dados e a expansão de conhecimentos sobre as necessidades institucionais em relação à gestão de dados. A realização deste programa mostrou-se exitosa no auxílio aos bibliotecários, principalmente no envolvimento com comunidades de pesquisa e no estabelecimento de parcerias institucionais.

Ao discorrerem sobre a necessidade de treinamentos de bibliotecários na área de gestão de dados de pesquisa, Shipman e Tang (2019) destacaram treinamento oferecido pela Academia de Bibliotecários de Gestão de Dados de Pesquisa, um projeto desenvolvido pela Elsevier, em parceria com uma equipe de bibliotecários e educadores em Ciência da Informação. O público-alvo deste treinamento foi composto por bibliotecários e o currículo constava 8 módulos de estudo que incluíram: 1) fundamentos da gestão de dados de pesquisa; 2) navegação na cultura de dados de pesquisa; 3) defesa e comercialização do valor da gestão de dados de pesquisa; 4) início de serviços de dados em bibliotecas; 5) gestão e avaliação de projetos; 6) visão geral das ferramentas de visualização e análise de dados; 7) visão geral das ferramentas de codificação; 8) visão geral das ferramentas de plataforma. Ressalta-se que a Academia continuará seus esforços em relação ao treinamento de bibliotecários.

Tenopir et al. (2014) conduziram estudo que analisou serviços de gestão de dados de pesquisa desempenhados nos Estados Unidos e Canadá, sob a ótica de diretores e bibliotecários de bibliotecas acadêmicas. Nesse sentido, o estudo demonstrou que o serviço de referência para a localização e citação de conjuntos de dados é o mais comum no âmbito de serviços de gestão de dados de pesquisa. Além disso, quase metade das bibliotecas analisadas ofereciam ou planejavam oferecer, no prazo de dois anos, serviços como o suporte a repositórios de dados de pesquisa, a criação de metadados para conjuntos de dados e a participação de bibliotecários em equipes de projetos de pesquisa.

Muitos diretores de bibliotecas inquiridos no estudo de Tenopir et al. (2014) (94 % dos participantes) alegaram promover conferências com objetivo de discutir e melhorar as habilidades de bibliotecários no fornecimento de serviços de gestão de dados de pesquisa. Ainda assim, foi observado que alguns desses profissionais consideraram que não apresentavam conhecimentos suficientes para executar atividades relacionadas à gestão de dados de modo efetivo. Consequentemente, tornou-se evidente a importância da educação continuada entre bibliotecários e a oportunidade de aprendizagem a partir de trabalhos colaborativos juntamente com professores, estudantes e pesquisadores.

Corrall, Kennan e Afzal (2013) procederam uma investigação que relacionou o serviço de suporte bibliométrico com o serviço de gestão de dados de pesquisa desempenhados por 140 bibliotecas acadêmicas na Austrália, Nova Zelândia, Irlanda e Reino Unido. Para tanto, o método de levantamento foi utilizado e a técnica de coleta de dados adotada foi a aplicação online de questionário constituído por questões de múltipla escolha. A amostra do estudo foi identificada por meio de lista disponibilizada por membros de organizações nacionais em cada um desses países, a saber: Council of Australian University Libraries (CAUL) na Austrália; o Consortium of National and University Libraries (CONUL) na Irlanda; o Council of New Zealand University Librarians (CONZUL) na Nova Zelândia e a Society of College, National and University Libraries (SCONUL) no Reino Unido.

Os resultados da pesquisa de Corrall, Kennan e Afzal (2013) demonstraram que a maioria das bibliotecas respondentes em cada país oferece algum tipo de serviço de gestão de dados, como treinamentos, elaboração de relatórios ou suporte a pesquisadores no depósito de dados de pesquisa em repositórios institucionais. Entretanto, tais serviços referidos compuseram parte de uma realidade bastante recente, na qual poucas bibliotecas os ofereciam ou planejavam oferecê-los no futuro.

Depreende-se do estudo de Corrall, Kennan e Afzal (2013) que um dos principais desafios enfrentados pelas bibliotecas investigadas é a lacuna de conhecimentos adequados à gestão de dados de pesquisa, explicitamente apontada por bibliotecários. Nesse sentido, a maioria dos participantes do estudo considerou necessária a integração de novas disciplinas a programas de educação em bibliotecas, para fins de formação de novos profissionais que atuem na área.

Ao analisarem aspectos da gestão de dados de pesquisa, Cox, Verbaan e Sen (2012a) destacaram o projeto RDMRose, desenvolvido por meio do White Rose Consortium, entre bibliotecas acadêmicas em Leeds, Sheffield e York. Esse projeto foi criado com o propósito de elaborar recursos educacionais que auxiliassem bibliotecários em sua atualização profissional e no aprimoramento de competências relacionadas à gestão de dados de pesquisa. Nesse contexto, os autores compilaram as principais diretrizes de aprendizagem desenvolvidas no projeto, com base na literatura científica e em grupos focais realizados com equipes de bibliotecários acadêmicos.

Cox, Verbaan e Sen (2012a) observaram que a gestão de dados de pesquisa é um campo de atuação profissional que compreende conceitos e jargões técnicos desconhecidos, ou pouco familiares a bibliotecários. Logo, os recursos educacionais devem ser elaborados de modo que esses profissionais apreendam confiança para operar eficazmente em um ambiente desafiador e propenso a mudanças. Isso implica na necessidade de superação de desafios atualmente vivenciados, como a compreensão da natureza diversificada e complexa dos dados de pesquisa e do ciclo de vida dos dados. Assim, a aprendizagem do bibliotecário deve ser exploratória, reflexiva e multiplicadora, de modo a influenciar toda a equipe de profissionais que lidam com a gestão de dados de pesquisa.

Tendo como pano de fundo a ampla utilização de recursos eletrônicos na sociedade, Cox, Verbaan e Sen (2012b) ainda destacaram a importância de bibliotecários reinventarem os papeis que desempenham na profissão. Considerando a adaptação a novas formas de trabalho no mundo digital aplicadas ao ambiente de biblioteca, como aquelas necessárias à gestão de dados de pesquisa, ressalta-se a importância do aprimoramento de habilidades de bibliotecários, tais como a organização de catálogos, a criação de repositórios e o oferecimento de consultorias especializadas.

Discussão dos estudos encontrados na literatura científica

A partir dos estudos sobre a gestão de dados de pesquisa em bibliotecas acadêmicas, foi possível elaborar um modelo que descreve a relação entre as ações de gestão de dados de pesquisa e os principais desafios vivenciados nesse contexto. A Figura 1 apresenta este modelo, sobre o qual serão feitas análises com base na literatura científica.

Fonte: elaborado pelos autores

Figura 1 Ações de gestão de dados de pesquisa e desafios enfrentados por bibliotecas acadêmicas  

A Figura 1 apresenta a síntese das ações de gestão de dados de pesquisa identificadas na literatura científica que têm sido conduzidas por bibliotecas acadêmicas. Essas ações giram em torno dos seguintes tópicos de discussão: elaboração da política de gestão de dados e do plano de gestão de dados, desenvolvimento de infraestrutura tecnológica, processamento e análise de dados, compartilhamento de dados, preservação de dados, capacitação de pesquisadores e de bibliotecários.

Nesse contexto, alguns desafios são evidenciados, os quais podem ser apontados a necessidade de treinamentos/capacitação direcionados a bibliotecários, a complexidade na colaboração entre diferentes departamentos e escritórios de pesquisa em universidades, a falta de recursos financeiros, a complexidade em lidar com a diversidade de dados decorrente das diferenças disciplinares, a criação de repositórios de dados de pesquisa, a definição de padrões para o compartilhamento e arquivamento de dados de pesquisa, e a investigação das práticas informacionais de pesquisadores (como produzem e comunicam os dados e resultados de suas pesquisas).

Ainda com relação à Figura 1, destaca-se que a gestão de dados de pesquisa no ambiente de bibliotecas acadêmicas ocorre de maneira colaborativa, incluindo diferentes stakeholders, os quais podem ser ilustrados por pesquisadores, outras bibliotecas, outros campus universitários e por conselhos de ética.

À vista do exposto, observa-se que bibliotecas acadêmicas tem se comprometido em elaborar políticas de gestão de dados de pesquisa nas universidades as quais são integrantes. Alguns desafios podem ser destacados sobre esse aspecto, como lidar com a diversidade de tipos de dados de pesquisa, em razão de diferenças disciplinares, e estabelecer parcerias entre departamentos e escritórios de pesquisa nas universidades.

Nessa direção, reiteram-se as considerações de Awre et al. (2015) a respeito das diferenças disciplinares no tocante aos dados de pesquisa e às dificuldades para geri-los, em decorrência disso. Os autores sinalizaram a falta de um consenso sobre a linguagem e conceitos concernentes aos dados de pesquisa, além da falta de investimentos financeiros destinados à gestão de dados. De modo semelhante, Marcum e George (2010) ressaltaram a diversidade de fontes pelas quais dados são produzidos/obtidos e a ampla cobertura temática a que se referem.

Acrescente-se, por oportuno, que bibliotecas acadêmicas também têm contribuído na elaboração do plano de gestão de dados de pesquisadores. Todavia, ressalta-se o desafio de bibliotecários em sensibilizá-los a respeito da importância do plano, antes mesmo do projeto de pesquisa ser iniciado. Tal situação reflete uma perspectiva de gestão de dados de pesquisa colaborativa, na qual profissionais de diferentes áreas do conhecimento atuam em prol da consecução de dados íntegros e que imprimam qualidade em relação à sua utilização. Nessa perspectiva, corroboram-se as argumentações de Sayão e Sales (2015) a respeito de uma gestão de dados de pesquisa conjunta em que as responsabilidades sejam compartilhadas. À luz desse contexto, é altamente recomendável que as bibliotecas acadêmicas exerçam novas funções enquanto unidades organizacionais pertencentes às universidades, incluindo atividades relacionadas à gestão de dados de pesquisa em suas rotinas de trabalho.

Outrossim, o desenvolvimento de infraestrutura tecnológica para fim de gestão de dados de pesquisa é uma ação fundamental desempenhada por bibliotecas acadêmicas. O uso de tecnologias de informação e comunicação aplicado à realidade dessas bibliotecas é cada vez mais frequente, corroborando estudos de Orera-Orera (2007) que resgatam algumas características da ‘sociedade da informação e do conhecimento’. Em um contexto marcado por inúmeros recursos propostos por meio da Internet, a autora argumenta que bibliotecas devem assumir novas práticas e estabelecer outras responsabilidades. Nesse sentido, reiteram-se os estudos de Bosc e Harnad (2005) e de Faqueti, Alves e Steil (2016), na medida em que é evidenciada a necessidade de bibliotecários se conscientizarem como profissionais atuantes decisivos na preservação e recuperação de informações disponíveis em meio impresso ou digital.

Uma vez que dados de pesquisa podem ser compartilhados, é importante que esses imprimam qualidade, principalmente quanto a sua disponibilização e acesso em repositórios de dados de pesquisa. Para tanto, bibliotecas acadêmicas têm destinado serviços voltados ao processamento e análise de dados, reiterando o suporte dessas instituições à pesquisa científica. De acordo com H. Yu (2017), cada vez mais, serviços de dados de pesquisa têm auxiliado a prática da pesquisa científica, por meio de atividades concernentes à coleta, à análise, à documentação, à descrição, ao armazenamento e ao compartilhamento de dados.

Ao promoverem ações que viabilizam o compartilhamento de dados de pesquisa, bibliotecas acadêmicas encontram um rol de desafios, os quais podem ser destacados a criação de repositórios de dados de pesquisa adequadamente estruturados com relação aos tipos de dados que serão hospedados e aos assuntos que cobrirão, a complexidade em estabelecer padrões para o compartilhamento e arquivamento de dados de pesquisa - como o uso de metadados para a descrição de dados de pesquisa e a utilização de DOI - e o uso de tecnologias aplicadas ao compartilhamento seguro de dados de pesquisa.

À vista disso, nota-se que o compartilhamento de dados de pesquisa no ambiente acadêmico é uma prática relevante no desenvolvimento de pesquisas científicas. Por conseguinte, bibliotecas têm sido elementos fundamentais para atingi-la, de modo a promoverem espaços colaborativos, principalmente, entre docentes, discentes e pesquisadores. Atrelado a esse contexto, cabe enfatizar os benefícios que podem ser obtidos por meio do compartilhamento de dados de pesquisa apontados por Piwowar et al. (2008). De acordo com os autores, tal prática pode proporcionar a redução de custos de pesquisas, maior visibilidade dos resultados de pesquisa, aumento no número de colaborações científicas e potencial crescimento da taxa de citação de publicações.

Ademais, bibliotecas acadêmicas têm concentrado esforços com vistas a ações de preservação de dados de pesquisa. Para tanto, é fundamental que bibliotecários compreendam a dinâmica do ciclo de vida dos dados de pesquisa e suas implicações na gestão desses dados. Nessa direção, destacam-se as considerações de H. Yu (2017) em relação à necessidade das bibliotecas em redefinirem suas prioridades, de modo a darem suporte à gestão do ciclo de vida dos dados de pesquisa em universidades.

A ação diretamente relacionada ao comportamento informacional de pesquisadores sobre os dados de pesquisa parece ainda pouco expressiva no âmbito das bibliotecas acadêmicas. Nesse sentido, observa-se que a capacitação/treinamentos direcionados a pesquisadores é uma ação fundamental para a gestão de dados e vem sendo realizada paulatinamente. Alguns desafios podem ser salientados sobre esse aspecto, como a necessidade de estudos que investiguem, em profundidade, as práticas de pesquisadores (como produzem e comunicam seus dados e quais serviços esperam obter da biblioteca) e o desenvolvimento de empatia do bibliotecário para compreender a perspectiva de pesquisadores.

À vista disso, corrobora-se o que Orera-Orera (2007) disse a respeito do relacionamento recíproco entre as bibliotecas acadêmicas e seus usuários, entendidos aqui como pesquisadores. Para a autora, tais bibliotecas são centros de recursos informacionais que têm a missão principal de oferecer acesso a registros do conhecimento à comunidade acadêmica, contribuindo para a execução de atividades de professores, estudantes e pesquisadores. Logo, é fundamental que bibliotecas agreguem ou intensifiquem em seu modelo de gestão ações orientadas à filosofia da globalização, à utilização de novas tecnologias de informação e comunicação, e à realização de atividades colaborativas com pesquisadores.

Outrossim, ressalta-se a complexidade de bibliotecários na prestação de serviços de gestão de dados de pesquisa e a consequente necessidade de capacitação/treinamentos para este grupo. Por essa razão, muitas bibliotecas acadêmicas tem realizado um conjunto de atividades delineadas em prol do aprimoramento de competências desses profissionais. São seminários, cursos, palestras, treinamentos, guias e manuais propostos para tal finalidade.

Nesse sentido, corroboram-se as iniciativas de bibliotecas referidas por Surkis e Read (2015), as quais elaboram guias sobre a gestão de dados de pesquisa e promovem consultorias a agências de fomento à pesquisa e a editores de publicações científicas.

Considerações finais

A produção científica e a comunicação de suas descobertas têm se modificado ao longo do tempo, ocasionando uma realidade marcada pelo intenso uso de tecnologias de informação e comunicação, grande produção de dados e realização de trabalhos mais integrados e colaborativos. Gray (2011) exemplificou esse contexto quando se referiu ao Quarto Paradigma da Ciência, cujas características abrangem: a exploração intensiva de dados; a coleta de dados por meio de diversos instrumentos e simuladores; alto nível de processamento de dados e informações armazenadas em computadores.

Diante do cenário delineado, os dados de pesquisa ganharam notoriedade no processo de comunicação científica. Assim, as bibliotecas acadêmicas, historicamente conhecidas pela organização e disponibilização de registros do conhecimento, tornaram-se instituições determinantes no âmbito do Quarto Paradigma da Ciência, conforme suas valiosas contribuições na gestão de dados de pesquisa. Isso inclui atividades relacionadas à elaboração da política e do plano de gestão de dados de pesquisa, ao desenvolvimento de infraestrutura tecnológica, ao processamento e à análise de dados, ao compartilhamento e à preservação de dados, à capacitação de pesquisadores e de bibliotecários.

Apesar disso, tais bibliotecas ainda enfrentam muitos desafios na gestão de dados de pesquisa, como: lidar com as diferenças disciplinares; a falta de recursos financeiros; dificuldades na sensibilização de pesquisadores em relação à elaboração do plano de gestão de dados; a criação de repositórios de dados de pesquisa; a falta de padrões para o compartilhamento e arquivamento de dados; e a falta de capacitação de bibliotecários para oferecerem serviços de gestão de dados de pesquisa. Para superá-los, a atualização profissional de bibliotecários torna-se elemento-chave.

O estudo se limitou à análise de um pequeno número de artigos de periódicos coletados em apenas uma base de dados - LISA, com o foco em Biblioteconomia e Ciência da Informação, não alcançando uma perspectiva multidisciplinar do fenômeno investigado. Por essa razão, considera-se inadequado generalizar os resultados obtidos em relação aos desafios vivenciados por bibliotecas acadêmicas no tocante à gestão de dados de pesquisa.

Nesse sentido, recomenda-se a realização de estudos que explorem a gestão de dados de pesquisa e seus desafios em outros contextos, como o de institutos de pesquisa, o de editoras científicas e o de governos, sob perspectivas disciplinares diversificadas.

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Para citar este texto: Carvalho, Érika Rayanne Silva de, Fernando César Lima Leite e Patrícia Rocha Bello Bertin. 2021. “Bibliotecas acadêmicas e gestão de dados de pesquisa: uma revisão bibliográfica”. Investigación Bibliotecológica: archivonomía, bibliotecología e información 35 (86): 99-121. http://dx.doi.org/10.22201/iibi.24488321xe.2021.86.58266

Recebido: 02 de Maio de 2020; Aceito: 20 de Agosto de 2020

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