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Educación química

versión impresa ISSN 0187-893X

Educ. quím vol.29 no.3 Ciudad de México ago. 2018

https://doi.org/10.22201/fq.18708404e.2018.3.63726 

Didáctica de la química

A experimentação no ensino de química: uma análise das abordagens nos livros didáticos

Experimentation in chemistry teaching: an analysis of the approaches in textbooks

Bruno Silva Leitea  * 

a Unidade Acadêmica de Serra Talhada, Universidade Federal Rural de Pernambuco, Serra Talhada/PE, Brasil.


Resumo

Os livros didáticos de química, via de regra, apresentam propostas de experimentos com o intuito de facilitar o aprendizado de seus leitores sobre determinados conceitos químicos, em alguns casos, conceitos abstratos. Todavia, tem-se observado poucas pesquisas envolvendo a identificação e explicação sobre os experimentos utilizados em livros didáticos direcionados ao ensino de química. Este trabalho descreve um estudo sobre os tipos de atividades experimentais encontradas nos livros didáticos de química. Assim, a partir de uma análise qualitativa, considerando uma pesquisa exploratória com análise documental, foram identificados 183 experimentos nos quinze livros analisados e categorizados em seis tipos de atividades experimentais. Os resultados mostram que boa parte das atividades experimentais propostas são da categoria do tipo empírico-indutivista, além de se argumentar a favor da necessidade de inclusão de atividades experimentais do tipo investigativa nos livros didáticos de química. Destaca-se ainda, que os livros analisados possuem lacunas ao abordarem a experimentação, indicando uma ideia de atividade experimental apenas como comprovação da teoria na prática.

Palavras-Chave Experimentação; Livro didático; Ensino de Química

Abstract

The Chemistry’s textbooks, as a rule, present proposals of experiments with the intention of facilitating the learning of its readers on certain chemical concepts, in some cases, abstract concepts. However, there has been little research involving identification and explanation of the experiments used in textbooks directed to chemistry teaching. This paper presents a study of the types of experimental activities found in Chemistry’s textbooks. Thus, from a qualitative analysis, considering an exploratory research with documentary analysis, a total of 183 experiments were identified in the fifteen analyzed books and categorized into six types of experimental activities. The results showed most of the experimental activities proposed in the Chemistry’s textbooks are of the empirical-inductivist type, besides arguing the need to include investigative experimental activities in the Chemistry’s textbooks. It is also noteworthy that the analyzed books still have gaps when they approach experimentation, indicating an idea of experimental activity only as a proof of the theory in practice.

Keywords Experimentation; Textbooks; Chemistry Teaching

Introdução

Pesquisas no ensino de ciências apontam para uma maior compreensão da relação entre a natureza da ciência e o papel da experimentação no ensino. Que relação possível seria essa? Ao longo da história, teorias foram desenvolvidas para explicar os fenômenos observados, embora que um processo investigativo não está limitado a um único caminho, ou seja, as experiências individuais podem contribuir com olhares diferentes para explicar o mesmo fenômeno. Assim, as explicações das ciências para determinados fenômenos são, efetivamente, transitórias. Essa transitoriedade é evidenciada quando uma teoria não consegue explicar novos fenômenos observados, por exemplo, o modelo atômico. Nesse sentido, a experimentação passou a ser foco principal quando surgiu a necessidade de explicar as teorias e observações. Ela deve ser percebida como um instrumento de explicitação de teorias, de enculturamento no discurso científico, promovendo a construção do conhecimento científico (Galiazzi & Gonçalves, 2004). Para Silva e colaboradores (2011, p. 235) a “experimentação no ensino deve ser entendida como uma atividade que permite a articulação entre fenômenos e teorias”. As teorias são formuladas para explicar determinados fatos e fenômenos observados. O uso dos trabalhos práticos de laboratório em sala de aula é um recurso didático que contempla diversas habilidades, dentre elas a cognição. Eles são um dos principais “alicerces que sustentam a complexa rede conceitual que estrutura o ensino de química” (Lisbôa, 2015, p. 198).

As estruturas físicas e organizacionais das instituições de ensino (escolas e universidades), têm influências múltiplas no processo de ensino e aprendizagem da experimentação (Gonçalves & Marques, 2016). Contudo, é preciso destacar que mesmo com bons laboratórios à disposição, alguns professores não fazem uso de atividades experimentais com seus alunos, ou seja, a ausência de laboratórios não pode ser determinante para a realização da experimentação. O professor, sem ter o laboratório em sua escola, pode utilizar recursos que são acessíveis aos alunos para preparar aulas experimentais com os materiais alternativos, sendo possível realizar os experimentos na própria sala de aula, utilizando o livro didático como um recurso complementar, envolvendo a participação efetiva dos alunos (Lima & Alves, 2016).

A experimentação no Ensino de Química

Pesquisas em ensino de ciências, em especial no ensino de química, têm contribuído para distinguir, direta ou indiretamente, compreensões sobre experimentação no ensino básico e superior. Então, por que ainda falar sobre a experimentação no ensino de química? Ela é tema constante nas salas de aula, nas conversas entre professores, nos eventos científicos, seja por sua “contribuição para o processo de ensino e aprendizagem ou pelas dificuldades encontradas para sua aplicação e desenvolvimento” (Suart, 2014, p. 63). Essa temática não é considerada ultrapassada. Pelo contrário, compreender os processos cognitivos envolvidos na experimentação é um campo bastante promissor e atual no ensino de ciências (Gomes, Borges, & Justi, 2008; Suart, 2014; Suart & Marcondes, 2009; Zômpero & Laburú, 2011).

A experimentação é utilizada como ferramenta para observação desde o período de Francis Bacon (1561-1626) com o método indutivista até o método hipotético-dedutivo de Karl Popper (1902-1994). A concepção tradicionalista ou tecnicista da atividade experimental se baseia na ideia da experimentação como comprovação de fatos e teorias, fundamentada na concepção empírico-indutivista, a qual destaca o papel da observação e da descoberta. Essa concepção não contempla a relação entre teoria e prática. Como observado na literatura, são como “receitas de bolo” (Domin, 1999; Ferreira, Hartwig, & Oliveira, 2010; Lima & Alves, 2016; Silva et al., 2011; Suart, 2014; Suart & Afonso, 2015) com pouca ou quase nenhuma discussão sobre os dados e resultados obtidos. É consenso de muitos pesquisadores que as atividades experimentais se encontram arraigadas em um entendimento empírico-indutivista de ciência (Caamaño, 2005; Galiazzi et al., 2001; Galiazzi & Gonçalves, 2004; Gonçalves & Marques, 2016; Silva et al., 2011; Suart & Afonso, 2015). A mudança no currículo e na formação do professor de química é um dos caminhos para enfrentar as concepções empírico-indutivista na experimentação. A experimentação pode ser uma estratégia didática para a promoção de debates, por meio da criação de problemas reais, que possibilitam a contextualização e a investigação. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio (Brasil, 1999) a contextualização é um recurso por meio do qual se busca dar um novo significado ao conhecimento escolar, dessa forma possibilita ao aluno obter uma aprendizagem mais significativa, além de assumir que todo conhecimento envolve uma relação entre sujeito e objeto.

Contextualizar o conteúdo das atividades experimentais é importante, por exemplo, relacionar os produtos químicos com seus usos e propriedades, associando com a realidade dos alunos. Assim, “ao planejar atividades experimentais que incluam a contextualização do conteúdo, é preciso apontar para relações culturais, sociais, econômicas e políticas” (Galiazzi & Gonçalves, 2004, p. 331). O conhecimento prévio dos alunos deve ser considerado no ensino de química (Souza, Leite, & Leite, 2015) e pode ser um ponto de partida para o professor abordar a experimentação. A experimentação em sala de aula pode favorecer a compreensão de um problema relacionado ao cotidiano do aluno. Os experimentos podem suscitar no estudante oportunidades de se familiarizar com o processo científico, adquirindo uma percepção diferenciada do “fazer ciência”. Uma das questões importantes da experimentação é a possibilidade de discussões que contemplem os três níveis de conhecimento químico: macroscópico, microscópico e representativo ou simbólico (Johnstone, 1982, 2000). Para outros autores os níveis são: observacional macroscópico, interpretação microscópica e a expressão representacional (Silva et al., 2011); de composição molar, composição atômico molecular e composição eletrônica (Jensen, 1998). Além disso, é preciso considerar o experimento como uma triangulação entre a teoria, o fenômeno e a representação (Mortimer, Machado, & Romanelli, 2000), em que essa triangulação se articulam e produzem uma aula mais argumentativa, dialógica e participativa.

Gott, Welford e Foulds (1988) propõem uma classificação baseada em cinco tipos de trabalho experimental: experimentos ilustrativos, experimentos informativos, experimentos de observação (incluindo a interpretação), uso de habilidades básicas (uso de instrumentos, medidas, etc.) e experimentos de pesquisa que, por sua vez, classifica-se como experimentos investigativos. Em uma classificação mais recente (Caamaño, 2004) propõe quatro tipos de atividades experimentais: experiências, experiências ilustrativas, exercícios práticos e de investigação. Mori e Curvelo (2017) destacam a complexidade encontrada na palavra experimentação, a partir da polissemia do termo atribuem a existência de diferentes enfoques e finalidades para o que se chama de atividade experimental didática (Araújo & Abib, 2003), que geralmente provoca confusões e entendimentos equivocados do que são trabalhos práticos, experimentos no ensino de ciências e experimentos na ciência (Hodson, 1988).

Livro didático de Química

Os parâmetros curriculares nacionais (PCN) recomendam o uso da experimentação, enfatizando a relação teoria-experimento, incorporando a contextualização e a interdisciplinaridade. No Brasil a escolha do livro didático é de responsabilidade do professor, contudo para subsidiá-lo neste processo de escolha o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) desenvolve, a cada três anos, o Guia de Livros Didáticos, disponibilizando resenhas das coleções consideradas adequadas para auxiliar o trabalho do educador. Um dos critérios de avaliação para o livro didático de química no Brasil de 2012 questiona se o livro “Traz uma visão de experimentação numa perspectiva investigativa, que leve os jovens a pensar a ciência como campo de construção de conhecimento, relacionando teoria, observação, pensamento e linguagem” (Brasil, 2011, p. 10). Em 2015 ele amplia este questionamento avaliando se o livro “apresenta experimentos adequados à realidade escolar, previamente testados e com periculosidade controlada, ressaltando a necessidade de alertas acerca dos cuidados específicos necessários para cada procedimento, indicando o modo correto para o descarte dos resíduos produzidos em cada experimento” (Brasil, 2014, p. 14).

Espera-se que os experimentos propostos nos livros de química, tanto do ensino médio como superior, não sejam utilizados para apenas comprovar a teoria ou motivar os alunos, mas que possam ser importantes no ensino e na compreensão da ciência. Em uma análise sobre os livros didáticos de química utilizados no ensino médio no Brasil, Schnetzler (2011) evidencia que esses apresentavam características do ensino tradicional, com ênfase na memorização e repetição dos conteúdos. Embora mudanças sejam observadas nas propostas dos livros didáticos de química, que buscam a problematização, contextualização do conhecimento químico, abordando experimentos investigativos, as concepções do ensino tradicional continuam fortemente presentes na prática pedagógica de muitos professores. Estes professores limitam-se à transferência de conhecimento do livro didático para o caderno do aluno (Quadros et al., 2011). O que de fato não deveria acontecer em hipótese alguma. É preciso o comprometimento do professor, construindo junto do aluno aquilo que se ensina. Contudo, não se pode exclusivamente responsabilizar o professor por tal problema. Sabe-se que a formação do professor é também limitada, pois muitos são formados na perspectiva de transferência de conhecimento, ou seja, o modelo de formação nos cursos de ensino superior também necessita ser revisto.

A iniciativa de desenvolver este estudo partiu das considerações apresentadas nos parágrafos anteriores e da constatação da inexistência de uma pesquisa que analisasse a presença de atividades experimentais em livros-texto brasileiros destinados ao ensino de Química no nível médio. Neste artigo apresenta-se o resultado de uma pesquisa em que se apresentam as proposições dos livros didáticos sobre a experimentação no ensino de química. Temos como argumentos construídos a partir da pesquisa que as atividades experimentais propostas nos livros didáticos sejam sugeridas de forma a contemplar a construção do conhecimento científico por meio da experimentação. Ademais, sabe-se que a capacidade de generalização e de previsão de uma teoria é que pode dar a experimentação um caráter investigativo (Silva, Machado & Tunes, 2011). Nesse sentido, investiga-se alguns experimentos descritos nos livros didáticos e a possibilidade destes apresentarem características de uma atividade experimental investigativa, ilustrativa, informativa, e/ou demonstrativa.

Metodologia

Nesta pesquisa, procedeu-se uma análise qualitativa (Creswell, 2014) das propostas de atividades experimentais presentes nos livros didáticos de química, baseando-se numa pesquisa exploratória com análise documental. As pesquisas exploratórias são desenvolvidas com o objetivo de explorar um tema pouco abordado (Gil, 2012). Segundo Malheiros (2011, p. 86) a análise documental deve ser “utilizada quando existe a necessidade de se analisar, criticar, rever ou ainda compreender um fenômeno específico ou fazer alguma consideração que seja viável com base na análise de documentos”.

A primeira etapa deste trabalho consistiu na escolha dos livros a serem analisados, foram cinco (05) coleções de livros-texto de Química, totalizando quinze (15) volumes. O critério para tal escolha baseou-se no fato deles serem livros comumente utilizados em escolas no Brasil e estarem disponíveis para análise. Além disso, realizou-se um breve levantamento em trinta e duas (32) escolas públicas nas capitais do Brasil e foi observado que alguns livros, embora tenham edições mais atuais disponíveis, ainda se encontram com as versões ultrapassadas, por exemplo, edições do ano de 1998, 2004 e 2006. Assim como critério de escolha optou-se analisar as edições dos livros que apresentavam maior número por edição nas escolas consultadas. Cabe destacar que, mesmo com o PNLD, há escolas que não utilizam nenhum dos livros sugeridos pelo programa. Ao longo deste trabalho, as coleções de livros analisadas foram denominadas por A, B, C, D e E, com o propósito de facilitar a leitura. Em relação aos volumes dos livros, categoriza-se pelos números 1, 2 e 3, que representam respectivamente 1º, 2º e 3º ano do Ensino Médio (EM), sendo descrito da seguinte forma: A1, B1, …, E1, para livros do primeiro ano, A2, B2, …, E2, para livros do segundo ano e A3, B3, …, E3, para livros do terceiro ano. A relação dos livros analisados encontra-se na Tabela 1.

Tabela 1 Relação dos livros analisados 

Código de identificação Livro Série Ano Autor(es)
A Química 1º Ano 2004 Ricardo Feltre
Físico-Química 2º Ano 2004
Química Orgânica 3º Ano 2004
B Química Cidadã 1º Ano 2013 Wildson Luiz Pereira dos Santos e
Gerson de Souza Mól
Química Cidadã 2º Ano 2013
Química Cidadã 3º Ano 2013
C Química na Abordagem do Cotidiano 1º Ano 2006 Miragaia Peruzzo
e Eduardo Leite do Canto
Química na Abordagem do Cotidiano 2º Ano 2006
Química na Abordagem do Cotidiano 3º Ano 2006
D Ser Protagonista Química 1º Ano 2013 Murilo Tissoni
Antunes (Editor)
Ser Protagonista Química 2º Ano 2013
Ser Protagonista Química 3 º Ano 2013
E Química: Meio ambiente, Cidadania, Tecnologia 1º Ano 2011 Martha Reis
Química: Meio ambiente, Cidadania, Tecnologia 2º Ano 2011
Química: Meio ambiente, Cidadania, Tecnologia 3º Ano 2011

Num segundo momento categorizamos as atividades experimentais em:

  • Empírico-indutivista: se baseia na ideia da experimentação como comprovação de fatos e teorias, destacando o papel da observação e da descoberta (Suart, 2014);

  • Demonstrativas: quando o experimento é realizado pelo professor enquanto os alunos apenas observam os fenômenos ocorridos, buscando comprovar algo já estabelecido, verificar ou confirmar uma teoria (Araújo & Abib, 2003; Gaspar & de Castro Monteiro, 2005); Nesta pesquisa, considera-se quando o experimento é descrito no livro apenas para que os alunos observem.

  • Ilustrativas: exemplificam os princípios de ilustrar a relação entre variáveis ou melhorar compreensão de certos conceitos, são utilizados para ilustrar princípios e leis, e interpretar fenômenos desde uma perspectiva construtivista (Caamaño, 2004);

  • Investigativas: partindo de uma situação problema, baseia-se na perspectiva da resolução de problemas, possibilitando realizar previsões e analisar os resultados (Suart, 2014), são utilizadas para construir conhecimento, compreender o processo da ciência e aprender a investigar (Caamaño, 2004);

  • Conceituais: que possibilitam a reelaboração de conceitos (Lisbôa, 2015), contribuindo para facilitar a reflexão e, consequentemente, o progresso intelectual (Araújo & Abib, 2003);

  • Técnicas: aquelas que discutem sobre segurança de laboratório, descarte de resíduos e manuseio de instrumentos e equipamentos, limitando-se a descrever procedimentos e técnicas (Gott et al., 1988), constituem atividades para a aprendizagem de métodos e técnicas e na determinação de propriedades (Caamaño, 2004).

A categorização foi realizada de forma que buscasse combinações e classificações entre o que é semelhante e reunir o que é comum. Para a análise qualitativa dos registros, fez-se uso da Análise de Conteúdo categorial (Bardin, 2008). Assim, os resultados foram analisados qualitativamente sob o ponto de vista das categorias de análise em todos os registros da pesquisa.

Na terceira etapa realiza-se as atribuições das atividades experimentais de cada livro as categorias propostas, destacando a análise conforme o ano em que o livro é abordado no ensino médio e o número de experimentos por livro/ano. Ademais, descrevemos como os experimentos são distribuídos por cada livro e sua incidência por categoria.

Na última etapa desta pesquisa, após a classificação de todas as atividades experimentais nos livros analisados segundo os critérios descritos e comentados na segunda etapa, procedeu-se à análise geral dos resultados encontrados visando discutir as questões de pesquisa originais e outros aspectos que emergiram durante a análise geral.

Análise geral das coleções

A linguagem observada nas cinco coleções analisadas contribui para a compreensão dos conteúdos, predominando a clareza e objetividade. Na coleção A os experimentos são apresentados a partir do conteúdo abordado, além de demonstrar uma preocupação com o descarte das substâncias utilizadas nos experimentos de modo que é indicado o local de descarte das substâncias utilizadas. Contudo, nos espaços reservados para a descrição dos experimentos, poucas imagens são disponibilizadas para auxiliar na percepção visual dos alunos sobre o experimento. Destaca-se também que, ao final de cada experimento são observados questionamentos para que os alunos respondam, o que é considerado não adequado pois seu intuito é de que o aluno “fixe” o conhecimento, caracterizando uma proposta que possivelmente conduzirá a uma aprendizagem mecânica. Essa coleção contempla quatro categorias ao longo de seus três livros. Assim, em nossa análise se observa que as atividades experimentais presentes em A1 apresentavam as categorias empírico-indutivista, demonstrativa, ilustrativa e investigativa. Já A2 e A3 continham apenas as categorias empírico-indutivista e demonstrativa. Cabe destacar que, as categorias empírico-indutivista e demonstrativa estão presentes em nos três livros. Em boa parte da coleção o autor não expõe o objetivo da atividade e o que se deseja com o desenvolvimento dessa experimentação. Os conhecimentos prévios dos estudantes são ignorados. As atividades não reservam espaço para a participação do aluno, que atua apenas como observador. Observa-se também que nas propostas dos experimentos, os questionamentos apresentados já apontam para o que os alunos devem ter atenção ou devem observar. Nesse sentido, não é dada autonomia para que o aluno por si só reflita e conclua sobre o que é relevante ou não sobre o experimento. Nesta coleção são propostas questões após o procedimento da atividade experimental, porém essas questões não visam promover a discussão nem incentivam a elaboração de hipóteses ou à argumentação. Além disso, não apresenta nenhuma introdução aos mesmos e são apresentados somente os materiais e procedimentos, como “receita de bolo” (Domin, 1999; Suart & Afonso, 2015). Em boa parte dos experimentos presentes na coleção não é estabelecido os espaços em que os experimentos devem ser realizados (escola, laboratório, etc.) e tão pouco orienta sobre o público (quantos alunos devem participar, se deve ser individualmente ou em grupo), além de não definirem o destino dos resíduos produzidos pela experimentação e as consequências relacionadas com este descarte (apesar de indicarem o local do descarte, não possibilitam a compreensão, por exemplo, das questões ambientais envolvidas). Os experimentos são sugeridos pelos conteúdos envolvidos na atividade, sem apresentarem algum tipo de título, o que suscita a falta de preocupação em indicar um objetivo prático para a atividade, ou seja, o que o aluno poderá alcançar com aquela atividade. Considera-se que a presença de um título contribuiria para nortear os alunos sobre o que seria possível se alcançar com a experimentação em questão. Apesar disso, o livro traz um aspecto positivo que é o uso de materiais nos experimentos, na maioria das vezes, de fácil obtenção e acesso, o que torna a prática mais fácil de ser realizada por não ser dispendiosa e complexa. Considera-se como ponto positivo o fato de alguns capítulos sugerirem mais de um experimento a ser realizado, o que possibilita ao professor ter mais chances de explorar os conteúdos propostos na experimentação.

Diferentemente da coleção A, todos os experimentos na coleção B apresentam títulos, os autores propõem como cada experimento pode ser realizado (sala de aula, em grupo, em casa, pelo professor, etc.). Cada experimento vem com uma explicação do porque o aluno fará aquela prática (para compreender algo novo sobre o conteúdo, relacionar com o cotidiano entre outros), além de explicar detalhadamente onde deve ser feito o descarte dos resíduos e o porquê. Durante os procedimentos de alguns experimentos há balões de textos com a palavra “pense”, que vão questionando o aluno sobre as etapas posteriores. Uma das propostas da coleção B é preparar o aluno para o exercício da cidadania, tomando como base os conceitos fundamentais da química e suas aplicações socioeconômicas, culturais, ambientais e tecnológicas, utilizando situações próximas à realidade do aluno, a contextualização neste sentido é considerada indispensável e essencial para relação conteúdo/realidade. Tal situação está em conformidade com as considerações de Galiazzi e Gonçalves (2004, p. 331), que “ao planejar atividades experimentais que incluam a contextualização do conteúdo, é preciso apontar para relações culturais, sociais, econômicas e políticas”. Essa coleção apresenta em alguns experimentos um tópico indicando a possibilidade de realizar a atividade experimental em sala de aula, no laboratório ou em casa. Além disso, alguns experimentos são propostos com o uso de materiais de baixo custo ou que podem ser facilmente substituídos por materiais alternativos. As atividades experimentais propostas nesta coleção possibilitam a realização das atividades tanto em grupo como individualmente, além de proporcionar aos alunos a capacidade de interpretar parâmetros que determinam o comportamento dos fenômenos observados, articulando-os com os conceitos científicos que conhecem. Ademais, proporcionam a capacidade de realizar generalizações, especialmente quando os resultados dos experimentos são extrapolados para novas situações. No que diz respeito as categorias observadas na coleção B, evidencia-se quatro categorias presentes nos três livros. Em B1 e B2 as categorias foram empírico-indutivista, demonstrativa, ilustrativa e investigativa e em B3 as categorias demonstrativa e investigativa. Ademais, destaca-se que a coleção faz uso dos diferentes tipos de experimentação discutidos aqui, logo, nota-se um cuidado dos autores em inserir o aluno ao máximo nas práticas, sabendo equilibrar o que deve ser apenas ilustrado e o que deve ser de fato refletido/investigado.

A coleção C contempla quatro categorias ao longo de seus três livros. Diferentemente das outras coleções, ela foi a única que contemplou uma atividade experimental baseada na categoria Técnica. Em C1 duas categorias estão presentes nas atividades experimentais (empírico-indutivista e demonstrativa). Três categorias são observadas em C2 (empírico-indutivista, demonstrativa e ilustrativa). As categorias demonstrativa, ilustrativa e técnica estão distribuídas nas atividades experimentais encontradas em C3. Observa-se que a experimentação é pouco disseminada nos livros desta coleção, embora seja reconhecida sua importância no processo de construção de conhecimento, há uma falta de articulação entre o conteúdo abordado (que por vezes é “mecânico”) e a atividade experimental proposta nesta coleção. Destaca-se que nas atividades experimentais nessa coleção, em boa parte, têm como objetivo tornar os experimentos “mais perceptíveis” aos alunos. Outro detalhe para ser destacado é que no livro C3 os autores utilizam fotografias para contextualizar os assuntos tratados e ilustrar aspectos experimentais.

Todos os experimentos da coleção D encontram-se no final de cada capitulo em uma sessão destinada, em que é apresentada uma sugestão de experimento referente ao conteúdo abordado durante todo capitulo. Em relação aos materiais observa-se que dependendo do tipo de experimento e dos materiais necessários, são indicadas sugestões de materiais alternativos e mais acessíveis para melhor execução da atividade proposta. Em cada experimento é apresentado um roteiro constando o nome do experimento, objetivo, materiais necessários, procedimento a ser seguido e questões norteadoras para análise e investigação relacionado ao experimento. Além disso, possui um roteiro com instruções relacionadas as normas de segurança no laboratório e descarte correto de reagentes. Ademais, a análise da coleção D mostrou que em relação a prática experimental, as atividades propostas não compreendem unicamente experimentos que se restringem a procedimentos executados em laboratórios, mas também atividades que propiciam a execução de atividades práticas em sala de aula e a análise de experimentos realizados ao longo da história ou vivenciados por estudantes em seu cotidiano. Assim como na coleção B, esta coleção apresenta conteúdos contextualizados com o objetivo de preparar o aluno para o exercício da cidadania. Destaca-se que esta coleção apresenta quatro categorias (empírico-indutivista, demonstrativa, investigativa e conceitual) e assim como a coleção C (ser a única que apresenta a categoria Técnica), a coleção D é a única que apresenta atividades experimentais do tipo conceitual. Detalhando estas categorias por livro, temos que em D1 suas atividades experimentais contemplam as categorias empírico-indutivista e conceitual. Já D2 são três categorias observadas (empírico-indutivista, investigativa e conceitual). As categorias observadas em D3 foram empírico-indutivista, demonstrativa e investigativa.

Por último a coleção E, dentre algumas características similares as demais coleções aqui já explanadas, o tópico “Teoria na Prática” apresenta uma abordagem das atividades experimentais, ao mostrar como o assunto em questão foi descoberto ou testado experimentalmente pelos cientistas, enfatizando a compreensão do conceito científico por meio de uma abordagem histórica da Ciência. Por exemplo, em um dos capítulos do livro é apresentado como Friedrich Wöhler (1800-1882) descobre acidentalmente a ureia a partir de materiais inorgânicos, contribuindo para a derrocada da força vital (Maar, 2011), explicando como o experimento foi realizado. Em alguns capítulos ao final dos experimentos há um conjunto de perguntas intitulado “Investigue”. Esse tópico apresenta perguntas relacionadas com o experimento observado/realizado. A presença de discussões antes e depois dos experimentos pode contribuir na realização da atividade experimental pelo aluno, desta maneira essa proposta se torna essencial para a percepção crítica do aluno, o que corrobora com as ideais de Galiazzi e Gonçalves (2004) ao afirmarem que realizar um experimento seguido de discussão para a montagem da interpretação dos resultados é uma atividade extremamente rica em termos de aprendizagem. A presença de uma contextualização antes do experimento com explicações sobre o que é o objeto de estudo é comumente observada em E3. Em relação as categorias analisadas a coleção E apresenta as atividades experimentais do tipo empírico-indutivista, demonstrativas e investigativas. As categorias empírico-indutivista e demonstrativa estão observadas em E1 e E3. Ao analisarmos E2 as categorias encontradas foram empírico-indutivista, demonstrativa e investigativa.

Diante da analise realizada nas coleções descritas nesta pesquisa, considera-se que a atividade experimental do tipo investigativa favorece a compreensão dos conceitos químicos, elas são importantes principalmente quando convergem seu caráter investigativo com sua função pedagógica, no intuito de auxiliar os estudantes na compreensão dos fenômenos envolvidos. Contudo, esperava-se que nos livros observados esta categoria apresentasse o maior número de propostas de atividades experimentais, o que de fato não ocorre. É importante ressaltar que, embora algumas instituições de ensino (superior e básica) não tenham disponíveis para seus professores laboratórios de ensino ou até tenham, porém não possuem materiais básicos necessários para a realização das atividades experimentais (Galiazzi & Gonçalves, 2004; Lima & Alves, 2016; Lisbôa, 2015; Silva et al., 2011; Suart & Afonso, 2015). Todavia, boa parte das coleções analisadas apresentam alguns experimentos que podem fazer uso de materiais de baixo custo ou de materiais alternativos, contribuindo para que a atividade experimental seja realizada sem precisar da infraestrutura de um laboratório de pesquisa.

A não uniformidade na distribuição das atividades experimentais nos capítulos dos livros analisados é comumente observada (exceto para a coleção D que tem um experimento em cada capítulo). Constata-se que os livros do 1º ano do EM apresentam níveis de dificuldade distintos, para o mesmo conteúdo, por exemplo, o experimento presente em C1 propõe realizar algumas soluções simples utilizando água, sal e açúcar. Já em E1 o conteúdo de soluções apresenta mais recursos e detalhes. Ademais, observa-se que algumas atividades experimentais propostas nas coleções são similares, por exemplo a atividade sobre estudo dos gases nos livros A1 e B1 que apresentam basicamente a mesma proposta de experimentação (Tabela 2).

Tabela 2 Experimentos similares presente nos livros. 

A1 B1
Tema: Estudo dos gases Tema: Compressibilidade dos gases
Materiais
  • 1 seringa plástica sem agulha

Procedimentos
  • 1. Puxe o êmbolo da seringa até a metade para que o ar entre dentro dela e feche-a, na extremidade, com o dedo.

  • 2. Sempre com a extremidade da seringa fechada, pressione (aumente a pressão sobre) o êmbolo para reduzir o volume de ar dentro da seringa.

  • 3. Solte o êmbolo e observe, anotando no caderno, o que ocorre.

  • 4. Ainda com a extremidade da seringa fechada, puxe o êmbolo a fim de aumentar o volume de ar dentro dela.

  • 5. Solte o êmbolo e observe, anotando no caderno, o que ocorreu.

Pergunta
Como varia o volume de ar dentro da seringa em relação à pressão exercida no êmbolo?
Materiais
  • 2 seringas de 10 mL Lamparina.

Procedimentos
  • 1. Em uma das seringas, coloque água até a marca de 7 mL. Com uma lamparina, aqueça a sua ponta, lacrando-a. Deixe esfriar.

  • 2. Encha a outra seringa com ar até a marca de 7 mL e aqueça a ponta para lacrá-la. Deixe esfriar.

  • 3. Agora, tente empurrar os êmbolos e observe o comportamento de cada seringa.

Análise de dados
  • 1. O que você observou?

  • 2. Em qual das seringas foi mais fácil para você empurrar o êmbolo?

  • 3. Proponha um modelo, por meio de desenhos, para os constituintes (partículas) dos materiais contidos em cada seringa.

  • 4. Cite exemplos do seu cotidiano em que você observa o comportamento dos gases similar ao do experimento e explique-os com base nesse modelo que você propôs.

Fonte: Extraído de A1 e B1.

Embora as duas propostas descritas na Tabela 2 apresentem similaridades, as metodologias podem ser consideradas distintas. Podemos inferir que em A1 há o predomínio da categoria ilustrativa (Caamaño, 2004), pois auxilia na compreensão e interpretação de um determinado fenômeno numa perspectiva construtivista. Já B1, além da categoria ilustrativa (Caamaño, 2004), considera-se que na análise dos dados há uma perspectiva investigativa a partir do momento em que os questionamentos são utilizados para construir o conhecimento, compreender o processo da ciência e aprender a investigar (Caamaño, 2004).

Nas atividades experimentais observadas nas coleções, as questões sugeridas aos alunos, em boa parte, referem-se as observações macroscópicas, não fazendo relação com possíveis interpretações microscópicas que poderiam ser observadas nos fenômenos descritos. A abordagem macroscópica por meio de atividades experimentais é importante para a aprendizagem de conceitos científicos, contudo consideramos insuficientes as abordagens nas coleções analisadas que não contemplavam os três níveis macroscópico, sub-microscópico e o simbólico (Johnstone, 2000).

De forma geral, em termos de categorização a que mais predomina nas coleções analisadas são as atividades experimentais do tipo empírico-indutivista, isto é, a experimentação é abordada com o intuito de comprovação de fatos e teorias, destacando o papel da observação e da descoberta. Além disso, considera-se que a presença dos três níveis de conhecimento químico (Jensen, 1998; Johnstone, 1982, 2000; Silva et al., 2011) equacionam o uso do livro pelos estudantes, contribuindo para o desenvolvimento de sua capacidade de abstração e de aprendizagem.

Análise das categorias

Um total de 183 experimentos foram encontrados nas cinco coleções analisadas (Tabela 3), destes foi possível classificá-los nas seis categorias investigadas e descritas na literatura (Araújo & Abib, 2003; Caamaño, 2004; Gaspar & de Castro Monteiro, 2005; Gott et al., 1988; Lisbôa, 2015; Suart, 2014).

Tabela 3 Experimentos encontrados nos livros analisados. 

Coleção 1º ano 2º ano 3º ano
A 18 28 9
B 14 10 4
C 19 4 8
D 17 18 13
E 8 9 4
Total 76 69 38

A divisão dos conteúdos de química nos livros do ensino médio é geralmente organizada da seguinte forma: os livros do 1º ano do EM abordam conteúdos de Química Geral e Inorgânica, do 2º ano do EM conteúdos envolvendo a Físico-Química e os do 3º ano do EM contemplam a Química Orgânica. É importante destacar que a coleção D apresenta pelo menos uma atividade experimental por capítulo, fato não observado nas demais coleções.

A análise realizada descreve que há um maior número de atividades experimentais propostas no 1º ano do EM, que representa o dobro de atividades experimentais sugeridas no 3º ano do EM. Esses dados permitem inferir que o maior número de atividades observadas no 1º ano do EM se deve (uma das possibilidades) ao fato de que boa parte dos conteúdos experimentais da química geral já são explorados por décadas na química (e em alguns casos por séculos) e por isso foram inseridos nos livros didáticos (Mortimer, 1988), ao tempo que alguns conteúdos (não todos) da química orgânica (a própria experimentação na orgânica), embora haja um vasto número de experimentos disponíveis em nível superior ainda pode ser considerada pequena sua presença no ensino médio, em livros didáticos e também nos laboratórios de ensino (Domin, 1999). Ademais, foi possível constatar a existência de certas limitações nas abordagens sugeridas por alguns autores nas atividades experimentais envolvendo a química orgânica, além de faltarem experimentos que conduzissem a compreensão dos conceitos próprios da química orgânica. A integração de experimentos em química orgânica em muitos casos não é de propor uma atividade experimental para o ensino de química orgânica, mas de demonstrar procedimentos técnicos, como realizar uma extração.

A Tabela 4 apresenta o número de atividades experimentais descritas nos livros em relação as seis categorias investigadas.

Tabela 4 Número de experimentos observados nos livros por ano. 

Categoria Total de experimentos por
livro do 1º ano
Total de experimentos por
livro do 2º ano
Total de experimentos por
livro do 3º ano
Empírico-indutivista A1(1); B1(2); C1(16); D1(8); E1(7) A2(22); B2(1); C2(1); D2(6); E2(6) A3(3); D3(1); E3(1)
Demonstrativas A1(12); B1(4); C1(3); E1(1) A2(6); B2(3); C2(2); E2(2) A3(6); B3(1); C3(4); D3(2); E3(3)
Ilustrativas A1(3); B1(4); B2(3); C2(1) C3(3)
Investigativas A1(2); B1(4) B2(3); D2(8); E2(1) B3(3); D3(10)
Conceituais D1(9) D2(4) -
Técnicas - - C3(1)

Na análise das propostas por categoria (Tabela 4) observa-se que o livro A2 apresenta o maior número de atividades experimentais do tipo empírico-indutivista, nestas atividades como já descrito por Suart (2014), o conhecimento científico é obtido daquilo que se observa, aplicando-se as regras do método científico, do papel da observação e da descoberta. É importante destacar que para o autor dessa coleção, os experimentos sugeridos na obra são baseados no modelo construtivista, o que de fato não foi observado na análise. Quando se considera as atividades experimentais do tipo demonstrativas o livro A1 apresenta o maior índice, embora seja recomendado em alguns casos (quando existem poucos recursos materiais, impossibilitando que vários grupos possam realizar o experimento ou não se dispõe de um espaço apropriado em que todos os alunos possam participar da execução de um determinado tipo de experimento), esse tipo atividade enaltece atividades experimentais voltadas à demonstração de verdades estabelecidas. Entre as atividades experimentais do tipo ilustrativa, o livro B1 descreve quatro experimentos (de quatorze proposto em todo o livro) que são utilizados para descrever princípios e leis (Caamaño, 2004). Na categoria investigativa, em que se considera sua importância em possibilitar que os alunos ocupem uma posição mais ativa no processo de construção do conhecimento, o livro D3 apresenta maior quantidade de atividades com essas características. Considera-se que este tipo de atividade experimental possibilita discussões nos três níveis químicos (observacional macroscópico, interpretação microscópica e a expressão representacional), assim constituindo-se uma estratégia promissora no processo de ensino e aprendizagem de química. As propostas descritas neste livro propõem a resolução de uma questão que será respondida pela realização de uma ou mais experiências. Partindo de uma situação problema de interesse do aluno, a fim de que este se motive e veja necessidade de aprender o conteúdo a ser desenvolvido. Na categoria do tipo conceitual, apenas os livros D1 e D2 possibilitam a reelaboração de conceitos (Lisbôa, 2015), contribuindo para facilitar a reflexão e, consequentemente, o progresso intelectual (Araújo & Abib, 2003). Quando a experimentação é realizada com o intuito de desenvolver habilidades cognitivas como pensamento crítico, elaboração de hipóteses, sínteses, ela possibilita a ruptura de visões dogmáticas do processo de construção do conhecimento científico. Por fim, encontra-se apenas no livro C3 uma atividade experimental com características do tipo técnica. É importante destacar que na análise dos livros algumas atividades experimentais apresentavam discussões sobre segurança de laboratório, descarte de resíduos e manuseio de instrumentos e equipamentos (Tabela 5), contudo apenas uma (C3) se limitava a descrever procedimentos e técnicas (Gott et al., 1988). Desta maneira, considera-se em nossa investigação que poucas propostas observadas nos livros constituem atividades experimentais para a aprendizagem de métodos e técnicas conforme descrito por Caamaño (2004).

Tabela 5 Avisos de cuidado na realização do experimento presente nos livros. 

A2 (Capítulo 5) E2 (Capítulo 15)
Tema: Equilíbrio Químico Homogêneo Tema: Efeito do íon comum no equilíbrio
Atenção: Para evitar acidentes, os materiais marcados com asterisco (*) devem ser preparados em solução adequadamente diluída e MANUSEADAOS EXCLUSIVAMENTE PELO PROFESSOR, pois, mesmo diluídos em pequena quantidade, são corrosivos, causam queimaduras e irritam a pele e os olhos. Nenhum dos reagentes deve entrar em contato com a pele, a boca e os olhos, nem deve ser aproximado do nariz.
Óculos de segurança, luvas e aventais protetores são altamente recomendados.
Dica de Segurança: O amoníaco é um líquido incolor, de odor forte e penetrante, obtido pela dissolução de até 30% de gás amônia em água. É altamente tóxico e irritante aos olhos. Evite o contato com a pele, as mucosas e os olhos. Caso isso ocorra, lave o local em água corrente por pelo menos 15 minutos e procure um médico.
CUIDADO! Responsabilidade é tudo!

Fonte: Extraído de A2 e E2.

Os dados alcançados revelam também um predomínio das atividades do tipo empírico-indutivista nos 1º e 2º anos do EM, conforme observado no Gráfico 1. Cachapuz et al. (2005) destacam na visão deformada empírico-indutivista que esse tipo de atividade se limita à observação e experimentação “na busca do descobrimento feliz”, o que corrobora com os resultados encontrados nos livros investigados em nossa pesquisa. Em relação aos livros do 3º ano do EM é possível que o maior número de atividades experimentais do tipo demonstrativas seja justificado pelas dificuldades em propor experimentos que possibilitassem a compreensão dos conceitos envolvidos no estudo da química orgânica.

Gráfico 1 Relação do número de propostas para as atividades experimentais nas categorias analisadas por ano do EM. 

Foi comum encontrar nos livros analisados propostas de atividades experimentais fundamentas no modelo “receita de bolo” em que quase nenhuma importância é dada para a organização, planejamento, pesquisa, análise ou interpretação dos resultados pelos envolvidos (Domin, 1999; Suart & Afonso, 2015). As coleções analisadas apresentavam, pelo menos em uma de suas propostas de experimentação, um caminho instrutivo que exigia menos esforço intelectual e tornava os processos cognitivos desnecessários, em oposição ao que advogam Gomes, Borges e Justi (2008); Suart e Marcondes (2009); Zômpero e Laburú (2011) sobre a importância desses processos, identificando-se com uma linha epistemológica empirista e indutivista e/ou demonstrativa, que por vezes é orientada através de roteiros. As atividades são sequenciadas de forma linear e são baseadas numa concepção tradicional (tecnicista) induzindo a ideia de experimentação como comprovação de fatos e teorias por meio da observação e da descoberta (Araújo & Abib, 2003; Gaspar & de Castro Monteiro, 2005; Suart, 2014). Considera-se que uma metodologia criativa e/ou dinâmica nas atividades experimentais pode estimular mais o aprendizado.

Considerações finais

Este artigo visou traçar um quadro geral sobre a experimentação descrita nos livros didáticos de química, ancorando-se em algumas discussões bastante difundidas na literatura sobre a experimentação, ressaltando suas características e tipos de abordagens relacionadas ao processo de aprendizagem no ensino de química. Os resultados nos levam a considerar a importância em transcender o caráter motivador e ilustrador das atividades experimentais nos livros didáticos e apontar para a necessidade de que sejam realizadas mais propostas de atividades do tipo investigativas.

Diante do exposto foi possível notar que as coleções analisadas ainda possuem lacunas ao abordarem a experimentação, de forma que através dos tipos de abordagem (categorias) se observem que há muitos experimentos do tipo empírico-indutivista, ou seja, ainda se está arraigada a ideia da experimentação apenas como comprovação da teoria na prática. Além disso, observa-se que os livros analisados não apresentam de forma satisfatórias as atividades experimentais investigativas, predominando atividades empírico-indutivista. Com isso, é preciso ter atenção nas atividades experimentais com pressupostos empiristas e indutivistas, que não apreciam características próprias das investigações científicas como a formulação de situações problemas, proposição de hipóteses e desenvolvimento de procedimentos.

O caminho por diversificar as atividades experimentais nos livros pode ser considerado importante, pois pode favorecer uma gama de propostas e de resultados significativos. Considera-se, como a grande maioria dos professores de química, que as atividades experimentais são fundamentais no ensino de química e que é possível nas categorias propostas, existir metodologias que favorecem a aprendizagem de conceitos, o desenvolvimento de habilidades e a capacidade para resolver problemas.

Os resultados desta pesquisa nos permitem argumentar em favor de atividades experimentais como um dos recursos nas aulas de química, e como tal, devem permitir a enculturação de alunos e professores. É fundamental desenvolver propostas adequadas de modo que ajudem a superar visões errôneas envolvendo as atividades experimentais. Assim como acontece nas práticas tradicionais de ensino que fazem uso do livro como um roteiro pronto e acabado para ser obedecido, as atividades experimentais propostas nos livros analisados, infelizmente ainda, seguem esta mesma postura.

Por fim, o livro didático usado adequadamente pelo professor é um recurso valioso para ajudar os alunos a avançarem em seus conhecimentos. Dessa maneira, as atividades experimentais presentes nos livros didáticos devem fazer parte do contexto normal do livro e que possibilitem aos alunos relacionarem os fenômenos e os conceitos químicos na construção de seu conhecimento.

Agradecimentos

Ao grupo de pesquisa LEUTEQ da Universidade Federal Rural de Pernambuco.

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1Conflito de interesses: Os autores declaram não haver conflito de interesses.

* Corresponding author. E-mail address: brunoleite@ufrpe.br (B.S. Leite).

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